A questão da pobreza no contexto de políticas públicas ditas democráticas é tema recorrente na agenda de pesquisadores, políticos e programas de desenvolvimento com os mais diversos matizes. De fato, segundo PNUD, um terço da população mundial vive abaixo do nível de pobreza, com privações em saúde, educação e padrões básicos de vida.

Segundo o IBGE, no Brasil, são 52 milhões de pessoas vivendo com menos de 15 reais por dia. Observa-se, particularmente nos meios acadêmicos e políticos, uma certa sensibilidade com a pobreza, não apenas na perspectiva humanitária, mais por se tratar de uma ameaça crescente à segurança das classes sociais fora da faixa de pobreza, ao crescimento da economia, à violência e à estabilidade social. Não deixa de ser, essa situação, uma motivação das políticas compensatórias nos limites do equilíbrio fiscal, ao mesmo tempo que se fala em redução do tamanho do estado, privatizações, desregulamentação e abertura da economia nacional aos mercados globalizados.

Essas populações mais pobres vivem em guetos urbanos com desemprego crescente ou em áreas rurais desprovidas de condições objetivas de produção; todas excluídas dos mercados, dominados por grandes empreendedores com apoio financeiros de bancos públicos e implementação de tecnologias de ponta, poupadoras de mão de obra.

Curiosamente, a pobreza como a moeda, tem face dupla: a política, porque não participa, efetiva e conscientemente, dos processos decisórios que dizem respeito às suas necessidades; a econômica, porque não participa, equitativamente, dos benefícios gerados pelo esforço comum.

Organização Social

Para se entender a situação destas populações carentes é importante distinguir três níveis complementares de organização, articulando as dimensões macro e micro sem escamotear as diferenças e contradições dialéticas de três formas de organização:

  • A organização de massas, onde se expressam, manifestações coletivas, contestações públicas; eleições, cada dia mais dominadas por líderes, ideologias e crenças.
  • Organizações institucionais, ordenadas por leis e regras do Estado das empresas, com divisões instituídas de poderes e deveres.
  • Organizações de base que se constitui de sujeitos coletivos conscientes de suas identidades em contraposição à impessoalidade das massas e à universalidade das instituições.

A organização social de base é um espaço onde se pode construir a práxis pela reflexão crítica das experiências individuais e coletivas; onde se constituem coletivos autônomos que se expressam politicamente nas relações com outros coletivos, com as autoridades instituídas e com outros segmentos da sociedade.

De outra parte, a experiência demonstra que as verdadeiras mudanças ocorrem de dentro para fora das pessoas e de baixo para cima das estruturas sociais obedecendo ao princípio da subsidiariedade (o valor do plano local, da proximidade)

Dependência ou autonomia

 Nesta perspectiva, é importante remarcar que nos guetos urbanos e rurais referidos acima, se expressam muito pouco as organizações de base, deixando a cada indivíduo ou família buscar soluções individualista, onde a saída depende mais das relações que cada um tem com os mais ricos e os mais poderosos, sejam eles empregadores potenciais, políticos clientelistas ou grupos de apoio humanitário.

Neste contexto parece fundamental trabalhar alternativa que permitam a essas populações estabelecer padrões básicos de organização de base para tomar suas próprias decisões e traçar seus próprios caminhos como coletivos organizados; inclusive pressionando as políticas públicas, se articulando para superar suas próprias dificuldades, aproveitando as oportunidades existentes nas políticas públicas e nos mercados.

É importante ressaltar que esse poder coletivo tem repercutido em mudança de atitude das instituições públicas produzindo transformações importantes nas relações políticas entre o Estado e as comunidades, à medida que deixam de tratá-las com objeto das benesses do Estado, reconhecendo-as como sujeitos coletivos do próprio desenvolvimento.

O compromisso central da mobilização e da formação política é com a autonomia do sujeito; uma autonomia, que se diferencia, ao mesmo tempo, do individualismo descomprometido com o social e da alienação do sujeito sob as determinações das estruturas instituídas.

Neste contexto, a maior ajuda que se poderia dar às comunidades carentes seria facilitar o processo de constituição e desenvolvimento de coletivos autorregulados, com base na capacidade de análise crítica do contexto político-econômico numa linha, orientada pela filosofia da práxis, com uma metodologia que não se concentre apenas na participação dos processos decisórios, mas que invista também na subjetividade das relações sociais, ultrapassando os limites da racionalidade instrumental dos diagnósticos e planejamentos participativos para compreender os mecanismos de dominação que se estabelecem nas relações sociais internas e externas à comunidade, considerando que o objetivo é subverter os processos de dominação e construir a autonomia política e o desenvolvimento da comunidade.

Um método

O complexo processo de construção da autonomia de uma comunidade de base deve permitir, em primeiro lugar, a apropriação da sua própria história, como ponto de referência central, com um método que permita entender dialeticamente e aceitar as diferenças, como ponto de partida para a construção de um poder coletivo.

Ao contrário do sujeito individual, o sujeito social (coletivo) não se define a partir de um substrato orgânico que lhe garantiria a integridade. É de fato uma organização postulada, construída coletivamente, que pretende se garantir a si mesma, para estabelecer a lei que especifica o social.

A nossa proposta é contribuir para essa construção coletiva em comunidades que se pretendam avançar como sujeitos das suas próprias histórias, com uma metodologia não diretiva.

A questão objetiva é como transformar um grupo de pessoas que vivem, cada um por si, num mesmo ambiente degradado em uma comunidade social de base com foco na integração das relações interpessoais, com um diálogo sistemático entre os indivíduos que constituem a comunidade, com foco em objetivos comuns, mas sempre buscando a explicitação e a escuta das posições individuais, inclusive de suas contradições.

O coletivo surge, assim, com a evolução da capacidade de escuta e a abertura para explicitar as singularidades individuais com relação aos temas tratados. O coletivo é construído num processo de interações. Os objetivos iniciais são o ponto de partida e o ponto de chegada; a transição é uma construção coletiva trabalhada numa metodologia apropriada, formatada teoricamente e constatada na prática, pela adesão dos participantes e pelos resultados atingidos.

O método de trabalho aqui proposto parte da teoria de grupos operativos desenvolvida por Pichon-Rivère e por Osvaldo Saidon nos anos 80. Parte da realidade objetiva de cada situação e dos objetivos envolvidos, com foco na análise integrada dos processos coletivos e individuais de maneira a garantir a autonomia do pensar individual na construção de posições coletivas comprometidas com os objetivos comuns, reduzindo as ansiedades e o estresse viabilizando um quadro de mudanças programadas, compatível com os objetivos almejados.

O compromisso central da mobilização e da formação política é com a autonomia do sujeito; uma autonomia, que se diferencia, ao mesmo tempo, do individualismo descomprometido com o social e da alienação do sujeito sob as determinações das estruturas instituídas.

Assim, a Linha de Ação Mobilização e Formação Política, articulada sob a forma de reforços mútuo com as outras linhas de Ação do Instituto, tem o foco voltado para o fortalecimento e a autonomia de segmentos da sociedade, onde o tecido social é mais frágil, onde a miséria estrutural pesa-lhes na sua existência: as comunidades da periferia.

Aécio Gomes de Matos

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OS EIXOS ESTRATÉGICOS DO IEPfD

Formação Política – por meio da transmissão do conhecimento, utilizando as modernas técnicas de comunicação e informação, pretendemos capacitar uma nova geração de líderes que encarnem os valores democráticos nas áreas em que atuam. O objetivo dos Cursos de Formação Política é transmitir conhecimento para ação, ou seja, contribuir na formação de uma nova geração de líderes, quer sejam comunitários, intelectuais, políticos ou empreendedores.

Políticas Públicas – o Instituto é compostos por ex-governadores, ex-ministros e empresários, enfim, gestores e pesquisadores qualificados para levar proposições de políticas públicas eficazes voltadas à modernização do Estado, a competitividade da economia e a superação das desigualdades sociais.

Projetos Estruturais – É sabido que o papel do terceiro setor é implementar ações complementares as ações do Estado, como menos burocracia e mais efetividade. O Objetivo deste eixo estratégico é criar e implementar projetos inovadores, que possam ser replicados, em um segundo momento, pelas várias instâncias do poder público, rompendo as ineficientes cadeias de programas onerosos e com poucos resultados, como é o caso da educação, por exemplo e das políticas assistencialistas.

Conheças os outros fóruns que constituem o Instituto:

Democracia e seus Desafios | Educação e Superação da Pobreza | Desigualdade Social e Democracia | Crise Ambiental e Democracia |Organização Social e Formação Política | Políticas Públicas e igualdade de oportunidades | Democracia na América Latina

 

O compromisso central da mobilização e formação de liderança é com a autonomia do sujeito; uma autonomia, que se diferencia, ao mesmo tempo, do individualismo descomprometido com o social e da alienação do sujeito sob as determinações das estruturas instituídas

- Aécio Gomes de Matos

Próximos eventos

05

Julho

IEPfD | POLÍTICAS PÚBLICAS QUE EMPOBRECEM O BRASIL – live com Marcos Mendes e Edmar Bacha

Live às 19:00 horas no dia 05 de julho de 2022. 

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